Depois de cinco anos do Câncer, descobri que estava grávida.
Uma grande surpresa, afinal eu já tenho dois filhos e jamais imaginei que
depois de tudo que eu vivi eu poderia gerar uma vida novamente, é quase que
contraditório – uma hora você está quase morrendo e depois você está gerando
uma vida! Só tenho uma coisa a dizer: Milagre!
A gravidez foi um tanto delicada, tive sangramentos no
início, a pressão subiu desde o começo e a asma que eu sempre tive insistiu em
se fazer presente, enfim fiquei afastada do trabalho a gravidez toda, em
repouso, tomando remédios para controlar a pressão e a asma, e indo em médicos
quase que semanalmente, exames sem fim... digo que já levei tanta picada na
veia que se eu reencarnar mais três vezes e não levar nenhuma picada de
injeção, tá pago!
Assim foi, até que no último mês minha pressão resolveu
subir de vez, como diz minha amiga Catarina, quando fui nascer disse que queria
a vida com emoção, e assim foi feito. Fui parar no hospital de onde moro com a
pressão a 18 por 11, tomei remédio, mais uma picada na veia e depois de algumas
horas ela baixou, mas mesmo assim não muito saí de lá com a pressão a 16 por 9.
Isso foi no sábado dia 03 de agosto, na segunda-feira dia 05, passei na minha
médica que disse que teria um Congresso naquela semana e que esperava que o
Romeo não nos aprontasse e decidisse nascer antes, mas como já lhes contei,
escolhi com emoção... assim, na sexta-feira dia 09, fomos para São Paulo para
comprar algumas coisas que ainda faltavam para o quarto do Romeo. Percebi que
minha pressão estava alta, e passamos pelo Pronto Atendimento da Maternidade
Pró Matre. Minha pressão estava alta, me medicaram, tomei mais uma picada na
veia, remédios via oral e minha pressão continuava nas alturas. Passadas uma 6
horas que estava lá e nada de baixar e pressão resolveram me dar um calmante e
retiraram o acesso da veia. Quando o médico foi me reexaminar para dar alta,
percebeu que eu estava bem pior do que havia chegado, o calmante fez a pressão
baixar, mas minha respiração sumir... tenho asma e o calmante acabou tendo um
efeito sobre minha respiração.
A partir daí foi uma correria só, e eu meio grogue não tenho
muita noção de horários, sei que fui examinada por um Médico de UTI que disse
para o outro que eu não poderia ir embora daquele jeito, o outro médico
concordou e aí apareceu mais um, e mais outro... percebi que o Romeo nasceria
antes, um dos médicos disse que havia muito risco para mim, e também para o
Romeo, que era arriscado ele nascer com 34 semanas, mas que continuar também
seria e ainda mais. Assim comecei a ser preparada para a cesárea, respondi
inúmeras questões para a enfermeira que colocava bolas adesivas nas fichas,
cada bola colorida significava uma coisa e meu prontuário recebeu muitas bolas
coloridas, pela pressão, pela asma, pelas alergias, pelo CA de mama, por não
poder perfurar ou comprimir braço esquerdo, enfim... o médico chegou e disse:
_Vamos fazer agora,
já!
Eu perguntei:
_Posso tomar banho
antes, estou o dia inteiro...
e antes que pudesse
terminar ele disse:
_Não! É agora!
Liberada a papelada de burocracia de convênio, fomos para a
sala de cirurgia. Fui anestesiada por uma médica muito boazinha, e tinha uma
outra que conversava comigo o tempo todo, cujo nome é o único que guardei
Fernanda, me mantinha acesa, pois o calmante estava fazendo efeito. Começaram a
me cortar e fizeram muita força, tiraram o Romeo e o levaram para uma sala ao
lado correndo, ele não chorou, eu olhava para o semblante do Alessandro e
falava para os médicos: _ Ele está passando mal! Fala para ele sair, ele vai
desmaiar.
Sempre tive essa mania, a de tentar desvendar o que o outro
está sentindo ou pensando pelo semblante, aprendi a desenvolver ainda mais essa
habilidade quando tive o câncer e via a cara dos médicos quando viam meus
exames e depois quando abriam meu curativo e viam que não estava fechando,
enfim, via na cara do Alessandro que a
situação era difícil, e tentei falar o menos possível, coisa que é quase
impossível.
Passado alguns minutos Romeo chorou , e nessa hora eu disse:
_Eu ouvi, ele chorou! E logo a enfermeira o trouxe e tiramos uma foto com o I Pad, já que não
estávamos com a câmera fotográfica, nem filmadora, pois não tínhamos ido
preparados para o parto, mas valeu o registro.
Fiquei na sala do pós operatório morrendo de sede, tinha
muita sede. Pedi água e a enfermeira disse que não podia, trocou de turno, pedi
para a que entrou, essa era mais generosa, me deu dois dedos de água que tomei
tão devagar para que parecesse um litro. Fui para o quarto era 6:00 da manhã,
Romeo nasceu às 02:27 da madrugada. Às 10 da manhã tomei banho, café e fui para
outro quarto. Nessa história toda, esqueci
de contar que meus filhos Freddy e Pedro estavam conosco o tempo todo e uma
enfermeira disse que o Alessandro só assistiria ao parto se tivesse um outro
adulto que ficasse com os meninos do lado de fora, assim o Alessandro ligou
para um amigo, a quem eu agradeço imensamente, que foi com sua esposa e ficaram
com eles até as 03:00 da manhã no hospital e os levaram para dormir na casa
deles, que é bem próximo ao hospital.
UTI
Quando estava tudo mais tranquilo o Alessandro me disse que
o Romeo estava na UTI, pois estava com desconforto respiratório e que isso era
meio que uma coisa normal, ainda que a palavra fosse UTI. Fomos vê-lo na UTI,
fui andando com o Alessandro me ajudando a carregar o soro, chegando na UTI
você tem que lavar as mãos, antebraços até o cotovelo com uma água quente e
seguindo vários passos, depois em cada incubadora tem um pote de álcool gel,
que vc passa também... cheguei na incubadora do Romeo, ele estava na sala 6 da
UTI, estava com sonda para se alimentar e no oxigênio. A gente se prepara para
tanta coisa, mas não para isso... passei mal, tontura, pressão, emoção, não
sei... mas não aguentei ficar muito tempo e saí de lá chorando.
Dia seguinte já me sentia melhor, fui mais vezes e comecei a
me ambientar, conversar com as enfermeiras, tentar entender como funcionava
todo aquele universo. Alí você ouve tantas histórias, tanta coisa que tudo
aquilo que você está passando se torna algo pequeno, por mais difíci que seja.
Mães de UTI não tem tempo de repouso, de descanso, de sentir dor, as
enfermeiras até falam da diferença das mães que tem filho e vão para a UTI e as
demais. Que as demais sentem mais dor, que reclamam mais, e que as da UTI não
tem tempo para isso. E é verdade. Tive alta na terça feira, dia 13 e o Romeo
continuou na UTI. Foi o dia mais difícil da minha vida, acho que nunca chorei
tanto, só chorava. Você tirar o quadrinho da porta da maternidade com o nome do
seu filho, guardar tudo e ir embora para casa e sem o seu filho, não estava nos
meus planos, nunca está nos planos de ninguém, foi muito triste. Cheguei em casa
e continuei chorando, foram 2 dias de muito choro. Na manhã seguinte antes da
09:00 da manhã já estava no hospital de novo, a essas alturas eu já havia feito
amizade com outras mães vizinhas de incubadora, com as enfermeiras e já tinha
aprendido a rotina da UTI, as visitas médicas onde passavam todos os
procedimentos realizados no Romeo, e assim por diante.
Na Pró Matre há uma sala para as mães cujos bebês estão na
UTI, lá as mães tomam café, almoçam, jantam, podem assistir TV e descansar, e
acreditem é uma correria só, você sobe para amamentar, desce para tirar
leite... ah o leite.
Não sei como, nem porque, mas como todos que acompanham o
blog sabem fiz mastectomia radical nos dois seios, o que em tese me impediria
de amamentar, já que não há glândulas mamárias, nem nada, mas como todos somos
um mistério e eu mais ainda, produzi leite! OS médicos achavam isso lindo, que
história! Eu também achei maravilhoso poder amamentar o Romeo, ainda que
somente com uma da mamas, pois a outra não há mamilo, então nem teria por onde
sair. Pediram que eu conversasse com o meu mastologista e visse se ele me
autorizava. Liguei no A.C. Camargo Câncer Center (ficou chique esse nome), e
conversei com o Dr. Juan, que também se espantou pelo fato de eu produzir leite
e que me liberou para amamentar. Amamentei alguns dias, mas nosso organismo é
tão perfeito que ao estimular a mama direita, a esquerda também começou a
produzir leite, a inchar, meu braço, minha mão, tudo, e ali, na mama
esquerda... não tinha como sair, acabou que começou a me prejudicar, tive muita
dor nas costas, febre... tive que parar, e ainda relutei em tomar essa decisão,
mas as médicas do Romeo, Dra. Angela e Dra. Vilma me tranquilizaram, nossa elas
foram fantásticas comigo, com ele, elas sempre me diziam: _Thaís vá tranquila,
aqui está cheio de “Julietas” para cuidar do seu Romeo!
O tempo foi passando e o Romeo não saía, tiraram a sonda
dele depois de uma semana, o que foi um alívio para mim e para ele, ele começou
a mamar no copinho, depois mamadeira, e oq eu segurava ele na UTI era a
respiração. Como nasceu de 34 semanas, o pulmão ainda não estava pronto e como foi
tudo de emergência não tive tempo de tomar uma vacina que as mulheres em risco
geralmente tomam para amadurecer o pulmão dos bebês. Foram tirando o oxigênio
dele aos poucos, até tirar totalmente aí ele teve uma oscilação grande e teve
de voltar tudo de novo, até ir reduzindo tudo novamente, assim ele foi para a Unidade
SEMI-INTENSIVA, até ter alta, foram dias de luta, dias muito difíceis, tive o
apoio de alguns anjos, Márcia Tamaki, Kemelly, Alessandra e o apoio incansável
do Alessandro, Freddy e do Pedro.
Com tudo isso acontecendo, após 7 dias da cesárea, tive uma
hemorragia pelo corte, espirrava sangue para todo lado, minha casa ficou cheia
de sangue, dobrei uma toalha de banho e fui para o hospital mais próximo, lá a
médica me explicou o que provavelmente estava acontecendo, que algum vaso não
teria sido cauterizado e que teria estourado. Fiz o curativo e fui para São
Paulo as 01:00 da manhã (sempre gostei da Av. Paulista à noite, mas nunca
pensei que iria frequentá-la dessa maneira). Chagando lá fizeram outra
drenagem, ultrassom, e adivinha, mais picadas...
Umas 06:00h saíram os resultados, uma coleção subcutânea!
Coleção?
Aí o médico explicou que ainda bem que era subcutânea, pois
se fosse mais profunda teria de voltar para cirurgia. Disse que eu teria de
drenar todo aquele sangue até sair tudo.
Aí todo dia que eu ia lá mesmo para ficar com o Romeo, eu
passava pelo PA para fazer drenagem e curativo. O Romeo teve alta e dois dias
depois tive outra hemorragia, aff... comigo é sempre assim... com muita emoção! Haja emoção! Dessa vez nem me
desesperei, nem nada, eu mesma apertei, entrei no chuveiro até parar de
espirrar, depois deitei na cama e o Alessandro me ajudou a apertar até parar de
sangrar.
Ainda tomo antibiótico e anti-inflamatório por conta dessa “coleção”,
tirei os pontos ontem, dia 03/09.
O Romeo está bem, lindo, mamando bastante e crescendo, e eu,
depois de tudo isso ainda não tive tempo de parar e pensar em tudo que
aconteceu, em como aconteceu, em nada, estou apenas fazendo o que sempre fiz, VIVENDO,
e acreditando que sempre tudo passa... tudo!
Quis compartilhar toda essa história com vocês, pois sei que
há muitas mulheres com câncer que sonham com a maternidade, quero mostrar que a
maternidade pós-câncer é possível sim, que as complicações que tive foram por
conta da pressão e asma, nada tiveram a ver com o câncer, então meninas não
desistam... acreditem e vão em frente!